Caderneta da Parteira

O que faz uma parteira em seu dia-a-dia? Para que tipo de atendimentos ela é procurada por sua comunidade, e com que frequência? Quanto tempo ela dedica ao cuidado? Qual o impacto de sua atuação enquanto rede de apoio para outras mulheres, enquanto detentora de saberes fitoterápicos e religiosos ancestrais? Algumas dessas questões têm norteado a pesquisa etnográfica com parteiras, sem, no entanto, esgotar sua abordagem.

A ideia deste projeto de pesquisa e inovação fomentado pela Fundação de Amparo a Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco (Facepe) é criar a Caderneta da Parteira, instrumento para anotação dos atendimentos realizados por essas mulheres em seu cotidiano, permitindo assim o conhecimento sobre o alcance de sua atuação (para além do atendimento a partos domiciliares).

A Caderneta da Parteira foi sugerida nas recomendações de salvaguarda no dossiê Parteiras Tradicionais do Brasil, entregue ao Iphan em 2021 (sob a coordenação da pesquisadora proponente desse projeto, a professora Elaine Müller do Departamento de Antropologia e Museologia da UFPE). A inspiração veio das Cadernetas Agroecológicas (que permitiram uma melhor visualização do trabalho “invisível” das mulheres agricultoras em seus quintais produtivos). Da mesma forma, propomos que o conhecimento sobre o cotidiano de parteiras poderá ser revelador de sua contribuição para o trabalho produtivo e reprodutivo.

Fotografia de um painel em que se lê: eu como mãe e parteira acompanha famílias do pré-natal ao nascimento e crescimento dessas famílias
Painel na Casa de Mãe Zezé, em Caruaru. Fotografia de Eduardo Queiroga (2008)

Uma Caderneta da Parteira pode ser um instrumento pertinente para dar subsídios à a aplicação de políticas públicas para o fomento da atuação dessas mulheres detentoras de saberes tradicionais e populares em saúde, pela sua importância cultural – são referências culturais em vias de reconhecimento como patrimônio cultural do Brasil – e como serviço de saúde – por prestarem uma assistência humanizada que complementa o Sistema Único de Saúde (SUS). Sabemos que a atuação de parteiras tradicionais não se restringe à assistência ao parto, englobando atividades de cuidado às crianças, gestantes, puérperas e famílias. O conhecimento detalhado dessa atuação cotidiana tem a importância de desfazer suposições cristalizadas sobre o que fazem as parteiras tradicionais, dando importância para sua simbiose, cuidado integral e relações de comadrio.

Apesar de seu potencial para a coleta de informações sobre suas práticas, quando acompanhadas por pesquisadoras e agentes públicos que acompanham o trabalho das parteiras tradicionais, entendemos que a Caderneta da Parteira deve ser um modelo de anotação útil para as parteiras, reunindo anotações como as realizadas por Maria Parteira, do Maranhão. Dona Maria costuma anotar as datas dos partos atendidos, com dados sobre mãe e bebê.

Já Dona Edileusa, de Recife, que faz uso de várias ervas medicinais não só no atendimento ao parto, mas nos cuidados com a saúde de sua comunidade, utilizou o espaço para informações sobre essas plantas no Livro da Parteira.

No Território Pankararu, parteiras como Mãe Dora também mantém seus registros dos nascimentos que acompanham, exercendo um importante papel para a notificação de partos ocorridos nas aldeias e sendo mantenedoras da memória primeira da vida de pessoas de sua etnia.

Validação da Caderneta da Parteira no Recife
Validação da Caderneta da Parteira no Recife

FICHA TÉCNICA:
Coordenadora geral:
Elaine Müller.
Cientista social (UFSC) com mestrado e doutorado em Antropologia (UFPE). Professora associada do Departamento de Antropologia e Museologia (DAM/UFPE). Coordenadora do Laboratório de Expografia do curso de Museologia (Expolab). Coordenadora do Programa de Extensão Museu da Parteira. Possui cerca de 16 anos de experiência na pesquisa e fomento do chamado patrimônio imaterial em Pernambuco, especialmente o relacionado às parteiras tradicionais. Coordenou a pesquisa sobre os Saberes e Práticas das Parteiras Tradicionais do Brasil (Iphan) projeto para instrução do processo de registro do ofício de parteira como patrimônio cultural imaterial do Brasil. Atuará no projeto como pesquisadora principal, responsável pela pesquisa de campo, coleta e análise de dados e pela estruturação dos princípios gerais a serem incorporados nas Cadernetas da Parteira.

Instituição parceira: Grupo Curumim Gestação e Parto
A ONG atuará no projeto acompanhando as atividades das pesquisadoras, contribuindo no planejamento e execução dos encontros de parteiras e na busca ativa por formas complementares de financiamento da segunda etapa do projeto.

Equipe do Grupo Narrativas do Nascer:
As/os participantes atuarão como colaboradoras/es da pesquisa, participando do grupo de estudos do qual serão discutidas bibliografias pertinentes ao projeto e contribuindo para a produção das Cadernetas da Parteira e sua metodologia a ser replicada em fases futuras do projeto. A equipe é formada pelo doutor Eduardo Queiroga, pela doutoranda Júlia Morim de Melo, pelas mestras Marina Maria Teixeira da Silva e Olívia Morim de Melo, pela mestranda Marília Nepomuceno Pinheiro e pelas alunas de graduação Helenita Cardoso de Sá e Laura Yasmin Farias Silva.


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